Kanye West - My Beautiful Dark Twisted Fantasy

I`m Living in the 21st century / Doin` something mean to it / Do it better than anybody you ever seen do it / Screams from the haters, got a nice ring to it / I guess every super hero need his theme music / No one man should have all that power...

Os versos iniciais de Power - provavelmente a melhor música do ano - já denunciam um Kanye West absurdamente prepotente ou irônico (ou os dois). Aquele que se auto proclama o super herói, capaz de fazer (ou tentar fazer) melhor do que qualquer outra pessoa, mesmo que admita que nenhum homem deveria ter tanto poder. Mas ele tem. E a crítica irá cair aos seus pés, diante de um àlbum tão escandalosamente sincero, que põe na mesa (musicalmente, diga-se) todas as personas incorporadas ou atribuídas ao rapper. Político, provocativo e marcante? Confere. Exímio produtor e compositor de belos refrões e melodias pop? Confere. Avesso à imagem e aos maneirismos (musicais ou não) do hip hop atual e da sua tendência gangsta? Confere. Rapper-indie, que curte Radiohead, Bon Iver, entre outros, e se preocupa com influências musicais que transcendem o universo da música negra americana? Confere.

Político, profético, harmonioso, singelo, emotivo, visceral. Esse é My Beautiful Dark Twisted Fantasy. Um dos melhores àlbuns de hip hop (err...porra! Foda-se o gênero...de música pop!) que iremos ouvir esse ano. E a crítica, como já indica a nota 10 dada ao disco pela P4K, deve estar se deliciando com um trabalho que preenche o seu Complexo de Épico e que, ao mesmo tempo, delicia a sensibilidade com abordagens intimistas, cotidianas e emotivas, sem soar piegas ou ultrapassado. Mas Kanye West faz questão de transcender a mera dicotomia do particular x universal. Seu maior paradigma, apesar de suas personas por vezes superarem o fato estético das composições, é o de ruptura com as estruturas particulares do hip hop em direção à universalidade do pop. Desde IZZO (H.O.V.A), do Jay-Z (talvez seu primeiro grande sucesso como produtor), Kanye demonstra a absurda capacidade de buscar elementos da música pop para quebrar a "secura" das batidas e declamações do hip hop atual (muito pior, diga-se de passagem, do que o funk carioca no quesito obscenidade, falácia e ostentação). É óbvio que Kanye não rompe com tudo isto apenas com suas roupas "alternativas" e com atitudes e entrevistas consideradas emo para qualquer outro rapper. Ele o faz com sua música. Se fosse só a imagem, como numa jogada de marketing para diferenciá-lo de seu contexto, esse disco não seria tão marcante.

Desde seu primeiro disco como compositor (o impressionante College Dropout), Kanye traz essa sua forma particular de produzir e cantar. Mais melodia na declamação, ou declamação na melodia. Refrões pontuais, orquestrações, samplers brilhantemente definidos e por aí vai (como na já citada Power do álbum novo, que mescla Afrobeat americano com King Crimson com a maior naturalidade). Kanye West realmente faz música pop, pouco importando de onde vieram seus parceiros, que adornam suas tracks com os versos rápidos declamados numa velocidade que, ele mesmo admite, não lhe é natural.

No mais, não me interessam as polêmicas pessoais; seu complexo de messias, ou a "redenção" após o vexame público protagonizado no VMA do ano passado. Na verdade, pouco importa o contexto da figura pública do Kanye. Se ele é milionário, comedor, arrogante e ainda assim consegue se "abrir" nas suas músicas, parabéns para ele. O que eu gosto de ouvir em seus àlbuns (e que não falta neste último) é música boa. Atual, atualizada, presente, marcante, influente...e sim, emotiva.

Tomara que a gente gaste mais tempo ouvindo esse disco do que discutindo-o e rotulando-o. Disco do ano? Não sei. Pra mim, o melhor disco de Hip Hop (se pertencer realmente ao gênero) que eu já ouvi, atrás apenas de Paul`s Boutique dos Beastie Boys. Mas isso realmente não importa tanto quanto as 13 faixas que me conquistaram e que não conseguem sair do meu itunes há mais de três dias.

Baixem aqui.

E, ah! Foda-se também se o próprio Kanye West quer se tornar o novo rei do pop depois de Michael Jackson, ou se a Pitchfork está afim de dar corda pra esse devaneio. Só a história vai dizer se esse disco é mesmo tão importante quanto hoje nós pensamos que pode ser...